sexta-feira, 16 de maio de 2014


UM SONHO DE MENINA

Tempos de sonhos. De bonecas.
Fantasias de uma criança sensível demais.
Acreditei em todas as mentiras.
Persegui o arco-íris.
Corri atrás de borboletas e esbarrei em realidades absurdas e incontestáveis.
Por que a vida não podia ser como eu a havia imaginado? Por quê? Por quê?
Vivi uma vida me perguntando o “por que”.
Vivi uma vida contemplando um sonho de menina.
Até um dia em que descobri que não há limites entre a realidade e o sonho, desde que acreditemos.
Não havia possibilidade de apagar o passado, não havia como apagar as minhas pegadas.
Só havia uma maneira de recomeçar tudo de novo sem consertar os erros cometidos.
Era só traçar uma nova reta, imaginar um novo ponto de partida e deixar guardado o passado.
Foi o que fiz, recomecei do nada, juntei

sonia delsin


UM SINO... UMA MANHÃ... UMA RUA

A chuva da noite lavou a rua.
Eu seguia pelas calçadas e notava os paralelepípedos límpidos. A chuva os tinha lavado.
As árvores estavam frescas e as casas muito úmidas.
Andava por um bairro antigo da cidadezinha onde nasci.
O silêncio me invadia e pela rua refletindo eu seguia.
De repente badaladas interromperam a quietude da manhã.
Foram sete as badaladas.
Os sons eram os do sino e dos meus passos na calçada.
Eu e Eu a conversar. A dialogar naquela manhã que começava a acordar.
O som metálico me parecia retumbar mesmo depois de silenciar.
Recordava-me outro tempo. Outro lugar.

Meu cérebro quer tudo registrar e meu coração tudo guardar...

sonia delsin  


BROTO DE BAMBU

Meu tio dizia que era entendido.
Por que não lhe dar ouvido?
Ele nos prometeu que prepararia uma iguaria que todos iriam se deliciar.
Quantos anos eu tinha?
Acredito que uns sete, oito no máximo.
Não esqueci o fato e aqui eu relato.
Era lindo este meu tio. Ele se casara com minha tia e o considerávamos muito. Muito mesmo.
Ele era lindo, divertido.
Como sempre senti a falta dele. Ele morreu há mais de vinte e cinco anos, mas parece que o vejo ainda à minha frente.
Recordo seus olhos castanhos, seu olhar inteligente.
Ele brincava muito com a gente.

Bem, vamos ao broto de bambu. Era isso que ele falou que prepararia e preparou. Mas só que o fez com o bambu errado ou sei lá o que se passou porque a iguaria de iguaria não tinha nada. Resultou num alimento amargo que ninguém foi capaz de engolir.

sonia delsin 


LUTO.... DEUS, QUE TRISTEZA!

Estes dias eu queria toda hora estar vendo os noticiários na TV e na net. Ficava acompanhando as competições do Pan. Cada medalha que um atleta recebia, eu me emocionava.
Ontem entrei para ler um pouco quando vi anunciado o acidente aéreo no aeroporto de Congonhas. Coisa pavorosa.
Minha mãe que via TV veio me procurar para contar. Ficamos as duas acompanhando os noticiários. Comentei com ela que cada passageiro já devia ter dito para si mesmo: cheguei são e salvo. Afinal já estavam dentro do aeroporto.
Deus, nós, os brasileiros, estamos de luto. Que tristeza. Que tristeza! Quantas mortes.
Hoje nem sinto vontade mais de acompanhar os acontecimentos dos jogos pan-americanos. Meu coração dói por cada pessoa que perdeu um ente querido. Por cada pessoa que partiu...
Tem hora que nos revolta. Estamos de mãos amarradas. Impotentes diante dos fatos.
Por que tudo isso tem que acontecer? Podia ser evitado?

Fazemos tantas perguntas e as respostas não chegam (na verdade chegam). Mais e mais notícias chegam através da mídia e nos atordoam. O coração quase nem aguenta tanta tragédia. Tanta coisa ruim acontecendo...

sonia delsin 


AMOR QUANDO CHEGA

O amor quando chega tem o dom de colorir o nosso mundo.
Eu conheci nestes tempos um senhor. Ele me falou logo que nos conhecemos que era uma pessoa triste e que a depressão estava acabando com ele.
Este senhor tem setenta e cinco anos e é um músico. Sempre me pareceu extremamente sensível.
Há duas semanas ele conheceu uma senhora que estava também se sentindo muito sozinha e os dois iniciaram um namoro.
Vejo-os sempre a dançar e estão sempre sorridentes.
Ontem eu o encontrei na piscina. Ele estava sozinho e começamos a conversar.
Contou-me então que o fato de estar namorando está deixando-o feliz demais e que se sente como um menino de novo.
Falei que isto é muito bom. E é mesmo. O amor tem o dom também de nos remoçar.
Fiquei muito contente em ouvi-lo. Sempre me alegro com a felicidade dos outros.

É, o amor é lindo e não tem tempo pra acontecer. Não tem idade o amor.

sonia delsin 


O NINHO DE SABIÁ NA JANELA

Têm coisas que não se explicam. Outras que se explicam. Têm coisas que nos levam a refletir. Respostas chegam prontas.
Mas nem todos têm a percepção para notar a mensagem oferecida.
Tantos fatos mexem com nossa vida.
Quando meu filho foi conhecer o apartamento que comprou notou que na janela do quarto que seria o seu e da esposa havia um ninho na janela. Um ninho de sabiá.
Aquele fato o tocou profundamente, pois sempre foi sabido em nossa família que meu falecido pai era louco por esta ave.
E completamente apaixonado por este meu filho.
Espiávamos os ovinhos, depois os filhotinhos. Os pais cuidando deles era a coisa mais linda de se ver, pois existia uma dedicação sem tamanho.
Em poucos dias voaram.
Estão sempre cantando pela redondeza e podemos apreciar.
Para mim é um sinal de bom agouro este ninho na janela.
Acho que as aves vieram trazer paz e alegria aos meus queridos.

Eu já tinha visto pássaros fazerem ninhos em vasos de flores, em sacadas, mas nunca numa janela foi a primeira vez.

sonia delsin 


AS BARREIRAS DO TEMPO

Podem dizer que é utopia. Que isto não existe. Não me importo que o digam.
Eu acredito. Acredito em portas que se abrem misteriosamente e trazem para o nosso cotidiano o passado que ficou tão distante.
Era uma manhã qualquer; nem era manhã ainda; era madrugada. Aurora pra ser mais exata.
Levantei-me como os sonâmbulos o fazem e nem o sabem que estão fazendo.
Olhei num espelho e vi uma imagem lá dentro.
Alguém que já tinha estado comigo num outro tempo.
Fantasia?
O que pode ser maior que o sonho?
O acreditar nele, talvez.
Pois bem. Passei algum tempo diante da imagem e ela falou comigo. Sem palavras audíveis, mas plausíveis.
Foi pura telepatia aquilo, mas existiu. Eu garanto que sim. Investi cem por cento do meu querer naquele acontecimento.
E não era coisa de momento.
Não era passatempo, entretenimento.
Nada disso. Era algo verdadeiro. Era algo que serviria pra me reformar por inteiro.
Nós dois sabíamos que estávamos vivendo uma magia maluca. Algo antigo; enterrado; morto; passado. Era como se fosse um destes feitiços que não entendemos como se começa e como se acaba.
Se é que se acaba algum dia...
Vencemos a barreira do tempo; do imaginário. Daquilo que se afirma cientificamente que não existe.
Mas que existe sim e mesmo que não se explique tem toda a razão para existir.
Conseguimos trazer de volta o éter de outros tempos. Concretizamos o abstrato.
E hoje eu lhe digo. Que aurora aquela! Que aurora!

Não há cortinas, não há véus... que consigam ocultar outros céus.

sonia delsin